Kirsty Griffin/Netflix
O filme, que estreou como um dos mais assistidos da Netflix, é um dos favoritos ao Oscar, tanto pela atuação de Benedict Cumberbatch quanto pela direção de Jane Campion
Ataque dos Cães ficou várias semanas na lista dos mais assistidos da Netflix, e não só porque é estrelado por Benedict Cumberbatch, o cultuado ator conhecido por interpretar o Doutor Estranho nos filmes da Marvel. Mesmo antes de receber 12 indicações ao Oscar 2022, o boca a boca também foi forte e aumentou exponencialmente a procura.
O que é bem curioso, porque o longa dirigido por Jane Campion é um faroeste dramático baseado no livro homônimo de Thomas Savage, de 1967. E, convenhamos, é um gênero não muito explorado pela geração streaming – o que em si já é um ponto interessante a ser analisado.
Os outros pontos são as ótimas atuações do casal (sim, eles são um casal na vida real) Kirsten Dunst e Jesse Plemons – ela como uma mulher atormentada por um passado sofrido, ele como um homem circunspecto, beirando a ingenuidade. Sem falar na grande aposta Kodi Smith-McPhee (que fez a versão americana de Deixe Ela Entrar e foi o mutante Noturno em X-Men: Apocalipse), em um papel deliciosamente enigmático, que parece desaparecer nas subtramas da narrativa. Tudo isso é amarrado pela direção e roteiro da neozelandesa Jane Campion, que se tornou a primeira mulher indicada duas vezes ao Oscar como diretora.
Trailer de Ataque dos Cães (2021)
Filme de Jane Campion é estrelado por Benedict Cumberbatch
Campion despontou em 1993 pelo incrível O Piano, que venceu o prêmio de roteiro original em 1994. O longa ainda rendeu o Oscar de melhor atriz a Holly Hunter e coadjuvante à ainda pequena Anna Paquin. E já trazia uma trama perturbadora e paisagens inóspitas que evocam nossa insignificância e solidão, elementos que Ataque dos Cães retoma.
São pontos que, com certeza, também pesam para alçar o novo filme à posição de um dos favoritos ao Oscar 2022.
Phil Burbank (Cumberbatch) é um caubói clássico: bronco, grosseiro com as pessoas e capaz de castrar um bezerro com dois golpes rápidos de faca. Ele nada nu no rio lamacento, sacrifica um boi empesteado sem dó nem piedade e vive recebendo dicas do irmão George (Plemons) para tomar banho.
Aliás, uma curiosidade: dizem que, durante as filmagens, Cumberbatch fez questão de também não tomar banho, para que o personagem fosse realmente repulsivo.
Mas essa casca serve para esconder sua sensibilidade, intelecto e alma atormentada por um passado misterioso. O ano é 1925. Os irmãos Burbank são fazendeiros ricos em Montana e têm praticamente apenas um ao outro (os pais são vivos, mas moram na cidade). Phil vive para a fazenda e é ligado a George de um modo doentio, tanto que cobra um maior envolvimento dele nas coisas da família.
George, por sua vez, está mais preocupado em cuidar da própria vida, gosta de tecnologia e modernidades e não parece partilhar dos mesmos interesses do irmão.
Jesse Plemons e Kirsten Dunst são um casal atormentado pelo protagonista de Ataque dos Cães, vivido por Benedict Cumberbatch
Kirsty Griffin/Netflix
Durante o manejo da boiada, os caubóis param em um restaurante administrado pela viúva Rose Gordon (Kirsten Dunst) e seu gentil filho Peter (Kodi Smith-McPhee). A delicadeza de Peter parece incomodar imensamente Phil, que faz bullying com o garoto, envergonhando a mãe dele na frente de todos.
Quem não acha graça nenhuma é George, que conforta Rose e, mais tarde, casa-se com ela, acendendo um ciúmes e indignação animalescos em Phil. Este se torna obcecado em provar para o irmão que a viúva está interessada em dar o golpe do baú.
Acontece que Phil não contava com a afeição que iria sentir por Peter, o filho de Rose. , o que faz com que a história se torne cada vez mais complicada, mas reveladora.
Ataque dos Cães é um filme lento e introspectivo, onde a fotografia, a luz e os cenários se tornam quase personagens da narrativa, interferindo nas cenas e nos rumos da história. Os enquadramentos em plano geral, mostrando a amplitude das paisagens áridas e despovoadas do deserto de Montana, somados à ausência total de trilha sonora incidental, convidam à reflexão e nos lançam em profunda e angustiante solidão, algo que se tornou a assinatura da diretora.
Em uma entrevista ao Festival de Cinema de Nova York, Campion explicou que se inspirou em experiências reais da vida do escritor Thomas Savage, que também cresceu em um rancho em Montana e tinha questões sobre sua sexualidade.
É um filme improvável e surpreendente e promete se valer dessas características na disputa pelo Oscar 2022.
Leva que tá doce! É sempre um prazer ver mulheres se destacarem na corrida ao Oscar. Vale prestigiar só por isso.
Dois pelo preço de um: Se gostou de O Piano (duh), você vai curtir esse aqui.
Presta atenção, freguesia: O figurino também é um ponto alto do filme, assim como a fotografia, já comentada. Já falei da fotografia? Pois é.
Gabi Franco
Editora de filmes e séries na Tangerina, Gabi Franco é criadora do Minas Nerds, jornalista, cineasta, mãe de gente, pet e planta. Ex- HBO, MTV, Folha, Globo… É marvete, mas até tem amigos DCnautas.
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