Divulgação/A24
Longa estrelado por Jessie Buckley e Rory Kinnear está em exibição nos cinemas e utiliza metáfora para discutir reflexos de um abuso para a mulher
Novo filme da A24, conhecida por títulos como Hereditário (2018) e O Farol (2019), Men: Faces do Medo (2022) é mais um acerto na galeria de horrores psicológicos da produtora. Dirigido por Alex Garland, do excelente Ex Machina (2014), o longa usa o terror para discutir traumas de abusos e relações tóxicas.
Estrelado por Jessie Buckley, que já mostrou talento para filmes com tramas “bizarras” em Estou Pensando em Acabar com Tudo (2020), Men usa metáforas simples o suficiente para discutir os reflexos de uma relação abusiva para a mulher. Embora muitas vezes confuso, o longa constrói alegorias para mostrar como a sombra de traumas continua perseguindo vítimas mesmo após o fim de um vínculo.
Na trama, Jessie vive Harper, sobrevivente de um relacionamento abusivo que busca fugir de seus traumas após o namorado James (Paapa Essiedu) cometer suicídio. Tóxico, o rapaz tentou responsabilizá-la não apenas pelo fracasso do namoro, mas também por sua decisão de tirar a própria vida.
Para escapar das memórias sombrias, a protagonista decide viajar e aluga uma casa no interior da Inglaterra. Longe da cidade grande, ela encontra o que poderia ser descrita como a residência perfeita para quem quer distância da realidade.
Dentro da atmosfera criada pela fotografia soturna do cinematógrafo Rob Hardy, Harper se encontra no que ela poderia chamar de toca do lobo. Ainda em recuperação da tragédia que transformou sua vida, ela enxerga cada homem que cruza seu caminho como um possível predador.
Rory Kinnear em cena de Men: Faces do Medo
Divulgação/A24
Desta forma, Garland usa Rory Kinnear para retratar os diferentes personagens masculinos que cruzam com Harper em seu autoexílio. Brilhante, o ator britânico de 44 anos trabalha com maestria ao criar características e detalhes específicos para cada um deles, realmente incorporando as personalidades distintas dos homens locais.
Do padre conservador ao policial machista, nenhum dos homens enxerga Harper apenas como vítima. É a maneira que o texto de Garland usa para isolar a protagonista em seu próprio trauma, sem lhe dar a opção de recorrer aos outros na busca por ajuda mesmo quando um peladão psicopata aparenta estar perseguindo-a.
O fato de Harper nunca reconhecer as semelhanças entre os personagens masculinos sinaliza o artifício narrativo que parte do público –principalmente os homens– pode nem notar a princípio, mas que faz todo o sentido emocional para a protagonista. Como vítima de abusos, ela os enxerga como iguais, predadores à espreita e sempre no aguardo de abocanhar sua presa.
Pela visão da personagem, este é um mundo moldado por suas experiências e memórias. Mesmo que algumas situações pareçam fantásticas demais, Men faz do absurdo uma tradução da verdade de Harper: apenas outra mulher pode entender o terror pelo qual está passando.
Entre alegorias e pequenos sustos, Men: Faces do Medo não sustenta o terror psicológico de qualidade até o final. Em certos momentos, o clímax dá lugar a uma sensação constante de que Garland esticou demais os delírios da personagem para, enfim, chegar a um ponto. Escolhas narrativas questionáveis, mas que não destroem os pontos positivos apresentados anteriormente.
Em tempos de blockbusters e filmes megalomaníacos, Men: Faces do Medo merecia estrear com mais atenção do público. Muito além das reflexões e metáforas, o longa é umas das boas surpresas reservadas para o cinema em 2022.
André Zuliani
Repórter de séries e filmes. Viciado em cultura pop, acompanha o mundo do entretenimento desde 2013. Tem pós-graduação em Jornalismo Digital pela ESPM e foi redator do Omelete.
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