Reprodução/TV Globo
Tenório (Murilo Benício) funciona como um alter ego de Bolsonaro em Pantanal, assim como outro bigodudo da ficção
A Globo não precisou de um bigode à la Groucho Marx (1890-1977) para esconder as críticas cabeludas a Jair Bolsonaro em Nos Tempos do Imperador. O político também se disfarça por trás de pelos faciais em Pantanal, mas nenhum deles é tão arrepiado quanto os de Tonico (Alexandre Nero). Apesar da discrição, Tenório (Murilo Benício) deixa a essência do político escapar todas as vezes que abre a boca na novela das nove da Globo.
O folhetim de Bruno Luperi não pega tão pesado politicamente quanto a produção de época, mas promete até falar mais no assunto com a chegada de Ibrahim (Dan Stulbach). Ele será responsável por alçar Jove (Jesuita Barbosa) a um cargo legislativo, provavelmente o de vereador –se seguir os rumos da versão original.
Nos Tempos do Imperador, ao contrário, era de chegar com o pé na porta ao abordar o tema. Tonico não só repetia alguns dos chavões do atual chefe do Executivo, como providencialmente ocupava um cargo de deputado –exatamente como Bolsonaro o fez durante 26 anos no Congresso Nacional.
Pantanal é bem mais cautelosa ao falar sobre política, até como se tivesse um tanto de receio em dar nome aos bois. Essas cabeças de gado são tanto as do agronegócio quanto a dos apoiadores do presidente, grupo em que Tenório facilmente passaria despercebido com uma camisa da seleção e um cartaz com bordas decoradas em crepom.
Se Tonico era capaz de repetir até o salmo preferido de Bolsonaro, o personagem de Murilo Benício não é tão direto assim. As similaridades entre os discursos da realidade e da ficção ficam mais nas entrelinhas, até para não assustar a audiência –ou espantá-la, exatamente como a novela das seis o fez.
A sabedoria popular diz que o diabo está nos detalhes, e assim é construído o marido de Bruaca (Isabel Teixeira). O machismo é um dos ingredientes dessa mistura, especialmente pela maneira como o empresário trata Guta (Julia Dalavia). Ou seja, a menina é quase uma “fraquejada”.
Ele ainda repete algumas das pautas mais caras ao bolsonarismo, como o apoio ao garimpo. Até mesmo o ilegal, como José Leôncio (Marcos Palmeira) recentemente descobriu. Tenório igualmente fez piadas um tanto duvidosas sobre minorias, aos se referir sobre os índios –que ficariam felizes com uma bermuda e uma parabólica, segundo ele.
A questão ambiental talvez seja o principal ponto em que Luperi puxe o bigode de Tenório para mais perto do presidente. Ele não é muito dado a pescar em áreas de preservação ambiental, mas não é para preservá-las. Afinal, o principal objetivo dele é construir um resort em pleno Pantanal em sociedade com o pai de Tadeu (José Loreto).
Daniel Farad
Repórter. Além do Notícias da TV, também se juntou ao Tangerina para combater a mesmice e o escorbuto. Escreve do Rio de Janeiro, onde se sente eternamente em uma novela do Manoel Carlos. Aqui, porém, a gente fala mexerica. Fale com o Daniel: vilela@tangerina.news
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