Divulgação/Camila Cara
Evento será lembrado pelas performances de alto nível, mas também por diversos erros de organização e mau comportamento do público
A coluna teve uma experiência agridoce no Popload Festival, na quarta-feira (12), em São Paulo. Por mais que tenha sido palco para shows memoráveis de atrações como Pixies, Jack White e Chet Faker, o evento será lembrado também —ou, talvez, mais ainda— por diversos erros de organização e mau comportamento do público.
Vamos por partes. Cheguei ao Popload Festival pouco antes das 15h, no começo do show da Fresno com participação da Pitty. Ou seja, não vivenciei o episódio turbulento com Jup do Bairro, que acusa o festival de boicote. Ela, que abriu os trabalhos no Centro Esportivo Tietê, teve seu show cortado no meio da última música, sem qualquer aviso ao público.
Testemunhas contam que foi, no mínimo, indelicado por parte da produção. O Popload Festival soltou uma nota de mea-culpa, pedindo desculpa “por não entregarmos o que você realmente merece”. A nota diz ainda que “estamos com a escuta aberta e esperamos estar juntos em futuras oportunidades”.
O staff de Jup do Bairro interpretou o comunicado como um deboche. Procurada, a equipe disse estar fragilizada e só deve se pronunciar melhor sobre o caso na semana que vem.
Foi um começo turbulento para o festival, que até ali funcionava bem, em termos de logística. A entrada foi tranquila e as filas ainda estavam pequenas. O espaço do CET é realmente muito agradável para a realização de um festival de música, arborizado, amplo e a grama sintética evitou possíveis constrangimentos causados pela rápida tempestade que caiu entre os shows de Cat Power e Chet Faker.
Fresno e Pitty juntos no Popload Festival
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Os preços, porém, eram abusivos. R$ 18 por um copo de chope em um festival no qual o público vai passar várias horas é acima do aceitável. Ainda mais sendo fornecido pela patrocinadora master do festival. O mesmo podemos falar do copo de água de 200 ml, que custava R$ 7.
Até a mencionada tempestade, tudo funcionava bem. Apoiada por um número considerável de fãs uniformizados, a Fresno —que substituiu a banda inglesa Years & Years de última hora— confirmou o ótimo momento pós-pandemia com um show dinâmico, bem executado e divertido. Lio, da Tuyo, fez participação improvisada em Cada Acidente, e Pitty dividiu vocais com Lucas Silveira em três músicas: Na Sua Estante, Casa Assombrada e Máscara. Faltou ensaio, claro, mas empolgou.
Cat Power no Popload Festival
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Apesar de aquele não ser o melhor ambiente para o seu show emotivo, Cat Power se recuperou da passagem constrangedora pelo Brasil em 2014, quando tocou no próprio Popload Festival. Tão delicada quanto intensa, a cantora foi simpática com o público e passou por diversos momentos de sua carreira iniciada quase três décadas atrás. Foi um belo acerto de contas.
Com o cair da tarde, o público que queria mesmo era ver Jack White e Pixies começou a chegar e, com ele, o caos. A faladeira que já tinha atrapalhado o show de Cat Power, numa falta de educação acima do aceitável em eventos deste porte, só aumentou durante a performance de Chet Faker.
No entanto, pior mesmo foram as filas. Teve quem ficou mais de uma hora —um show inteiro!— para carregar os cartões de consumo, que eram o único meio de pagamento no Popload Festival. Se não há alternativas, que disponham mais caixas. Depois, as mesmas enormes filas migraram para os bares, também minguados.
A bola de neve chegou, claro, nos banheiros. Ou melhor, no banheiro. Só havia um espaço destinado a ele, distante do palco. Os relatos sobre a falta de limpeza nas cabines femininas são dignos de filmes de terror.
Chet Faker no Popload Festival
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Enquanto isso, Chet Faker mostrava no palco que, às vezes, menos pode ser mais. Numa performance que remeteu à que ele fez no projeto Boiler Room oito anos atrás, o barbudão australiano se apresentou sozinho, de peito (e roupão) aberto.
Usou bases pré-gravadas para soltar o lado mais dançante de suas deliciosas composições, enquanto cantava e tocava —ora teclado, ora guitarra— ao vivo. Foi o show perfeito para o fim da tarde e começo da noite, encerrado por hits da época que surgiu como novidade irresistível do indie eletrônico, como No Diggity, Gold e Talk Is Cheap.
Findado o show, as filas voltaram com força. É bom pontuar que os caixas ficavam relativamente próximos ao palco. Ou seja, a extensão das filas impactava também a circulação de quem queria chegar ou sair dos shows. Não havia pessoas organizando, o que possibilitou outros episódios de má educação do público, com muitos furando as filas e destratando funcionários dos bares.
Jack White no Popload Festival
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Com Jack White no palco, deu pra deixar os problemas de lado, mais uma vez. Ficou tudo azul, a começar pelo cabelo do roqueiro, a jaqueta da Seleção Brasileira e as projeções no telão. Músico de primeira, ele fez o show que o público queria ver.
Os maiores sucessos do White Stripes —Seven Nation Army, Fell in Live With a Girl, Icky Thump—, do Raconteurs —Steady, as She Goes, You Don’t Understand Me— puxaram o repertório certeiro, adornado por solos de guitarra indecifráveis e uma banda azeitada que sabia segurar o peso desejado pelo frontman. Jack White contou uma bela história sobre o rock no Popload Festival e saiu ovacionado.
Por fim, o Pixies. Com heróis do indie rock, a banda norte-americana mostrou que discursos não são fundamentais para jogar para a galera. Com um setlist matador, enfileirando sucessos sem intervalos, Black Francis não chegou nem a dar “oi” para os fãs, que nem sentiram falta.
Por outro lado, foi sentida, sim, a duração abaixo do esperado. O Pixies tocou durante uma hora e 15 minutos no Popload Festival, num total de 24 músicas. Na véspera, no show solo que tinham feito no Rio de Janeiro, foram 38 canções e mais de duas horas de apresentação, o que costuma ser o normal da banda.
As ausências foram lembradas depois, nos papos de volta para casa. Lá na hora, o que marcou foi a sequência de encerramento com Here Comes Your Man, Wave of Mutilation (tocada pela segunda vez, agora em versão surf music), Ana, Where Is My Mind? e Winterlong (cover de Neil Young). Uma fila —essa, sim, positiva— de sucessos para deixar quase toda banda de rock de queixo caído.
Visão aérea do Centro Esportivo Tietê no Popload Festival
Divulgação
No balanço final, dá para dizer que o Popload Festival só não ficou marcado negativamente porque os artistas deram o melhor de si no palco e ajudaram a jogar a balança da experiência para cima.
Mas, tirando isso e a boa “descoberta” do Centro Esportivo Tietê — que recebeu, segundo a organização, 14,5 mil pessoas —, o evento vai ter muito trabalho pela frente para reconquistar a confiança de quem pagou caro para ir nesta edição.
Luccas Oliveira
Luccas Oliveira é editor de música na Tangerina e assina a coluna Na Grade, um guia sobre os principais shows e festivais que acontecem pelo país. Ex-jornal O Globo, fuçador do rock ao sertanejo e pai de gatos, trocou o Rio por São Paulo para curtir o fervo da noite paulistana.
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