Divulgação/FX
Ator que chegou ao auge na TV norte-americana largou tudo para se dedicar ao Direito; agora, voltou a emprestar sua voz para o príncipe Naveen
Um dos primeiros brasileiros a fazer sucesso em Hollywood, Bruno Campos abandonou a atuação para virar advogado em Nova York. Apesar de ter virado essa página de sua vida, ele relembrou os tempos de artista para um novo brinquedo nos parques de diversão da Disney com temática de A Princesa e o Sapo –o ator, afinal, fez a voz original do príncipe Naveen na animação de 2009.
“Nos últimos 13 anos, fiz outras gravações como o príncipe Naveen para produtos auxiliares da Disney. Então, pratiquei a voz aqui e ali. Mas este projeto é muito especial. Estão fazendo do filme uma parte permanente dos parques da Disney. Essas coisas vivem para sempre. Eu vi fotos da atração, vai ser bem linda”, conta Campos em entrevista exclusiva à Tangerina.
Chamado de Tiana’s Bayou Adventure, o brinquedo vai substituir o clássico Splash Mountain –associado à controversa animação A Canção do Sul (1946), que hoje é considerada racista. A inauguração está prevista para o fim de 2024 na Disneyland (na Califórnia) e no Magic Kindgom (em Orlando). Depois, chegará também ao parque localizado em Tóquio.
Apesar da experiência de voltar a ser o príncipe Naveen, Bruno Campos não pretende retomar a carreira artística. “É um passado divertido. Mas ainda adoro estudar filmes nos meus tempos livres, como sempre fiz”, minimiza ele, que começou a cogitar a mudança de área profissional aos 25 anos, quando já tinha estrelado o filme O Quatrilho (1995), representante do Brasil no Oscar.
Na época, o brasileiro protagonizava a comédia Jesse (1998-2000), em que fazia par romântico com Christina Applegate. “A decisão foi incremental. Eu estava desfrutando do sucesso. E uma voz interna me disse claramente: ‘Você vai deixar esta vida mais cedo do que pensa’. E eu sabia que era verdade, só não sabia quando mudaria e para quê. Esses detalhes entraram em foco na década seguinte”, lembra ele.
J.K. Simmons, Sarah Paulson, Steven Weber e Bruno Campos na série The D.A.
Divulgação/ABC
A virada de página não foi por falta de trabalho: nos anos 2000, Bruno Campos estrelou a série Leap Years (2001), participou de cinco episódios de Plantão Médico (1994-2009) e teve um arco marcante em Nip/Tuck (2003-2010) como um médico que escondia um segredo sombrio. Também viveu um advogado no drama jurídico The D.A. (2004) –colocando-o novamente em contato com um mundo que já o procurava há muito tempo.
“Meu pai foi advogado no início e no fim de sua vida. Seu estilo analítico foi a minha primeira influência. Mas sim, a série The D.A., quando eu tinha 27 anos, me impactou. Nosso consultor jurídico [Gil Garcetti] era o ex-promotor de Los Angeles, que havia processado O.J. Simpson por duplo homicídio por volta de 1995. E entrevistei uma dúzia de advogados generosos como parte da minha pesquisa”, lembra.
Com a vocação para o Direito falando mais alto, Bruno Campos abandonou a atuação e se formou advogado em 2013, quando estava prestes a completar 40 anos. Recomeçar a essa altura da vida foi tranquilo, diz ele. “Nunca é tarde demais para fazer mudanças. As pessoas mudam suas vidas todos os dias. A vida é mudança. Minha idade quando optei por essa mudança não era uma preocupação –não estava sonhando em me tornar uma estrela de futebol”, brinca.
Ele evita, no entanto, comparar as duas carreiras ou definir a advocacia como algo mais “útil” para a população. “O Direito é, no final, mais concreto e direto. Resolvemos as necessidades e os obstáculos legais e empresariais dos clientes, que muitas vezes são de alto risco. Dito isso, eu nunca separaria uma profissão como tendo mais ‘utilidade’ do que outra. A arte e o entretenimento servem a uma vasta utilidade –em seu auge, beneficiam a sociedade como atividade econômica em massa e também em termos psicológicos. Eles são a moeda da alma. A alma pode não ser concreta, mas você não pode ir longe sem uma.”
Campos com a mulher, Karina, e seus filhos, Aris e Kora
Bruno Campos ajudou a abrir as portas de Hollywood para outros brasileiros –como Rodrigo Santoro, Wagner Moura e Alice Braga. Defende, porém, que não há uma chave para o sucesso e afirma que desencorajaria qualquer um a atuar. Ele aponta que a persistência e a força de vontade são qualidades essenciais para um ator. “Aqueles que não podem ser desencorajados não dormirão até encontrarem um caminho. Aqueles têm uma chance. Esse é o meu conselho”, resume.
“Não estou escondendo um código secreto. Fui para Hollywood aos 22 anos, com um visto de poucos meses e sem um lugar para ficar ou conhecendo alguém que pudesse me ajudar. Foi irracional. Se bem me lembro, 90% dos atores nos EUA estão desempregados e apenas uma fração dos empregados ganham a vida. Imagine se as taxas de desemprego e renda do país espelhassem esses números”, ressalta.
“Então, sua própria capacidade de visualizar seu sucesso, a curto e longo prazo, tem que exceder muito a visão de qualquer um sobre você, porque é você que tem que convencer continuamente o mercado de que existe. Se você pode ser convencido a desistir, talvez esteja esperando ser convencido a desistir. Mas, se tem algo para comercializar e sua visão é forte o suficiente, você será relativamente imune ao desânimo, ignorará a realidade e talvez a dobrará a essa visão.”
O pensamento se estende aos dois filhos, Aris, de dez anos, e Kora, de quatro –os dois são frutos do casamento de Bruno com a psicóloga Karina. “Faria tudo para convencê-los a não se tornarem artistas profissionais. Dito isso, encorajo entusiasticamente a busca da arte como disciplina e expressão pessoal. É saudável e necessário”, aponta.
Aris, inclusive, venceu uma competição internacional de música aos sete anos e pôde se apresentar tocando piano no Carnegie Hall, uma das salas de concertos mais tradicionais de Nova York. “Daí ele logo descobriu esportes, e sua principal paixão mudou para o beisebol. O que significa que o beisebol agora é minha principal paixão, para que eu possa ser útil para ele. Ele pode lançar bolas a 80 quilômetros por hora com precisão, e rebater bolas lançadas por uma máquina a 105 quilômetros por hora”, conta o pai coruja.
As experiências no esporte também trazem alguns contratempos. “Recentemente ele acertou uma bola na minha têmpora, causando uma concussão e uma visita divertida ao pronto-socorro. E, sabe, enquanto eu estava lá, esperando para ouvir se eu tinha algum dano interno, meu pensamento principal era: ‘Ótimo lançamento, filho’. Enfim, agora uso uma máscara de apanhador profissional quando treinamos para que meu filho em crescimento não possa me decapitar. Quando minha filha de quatro anos começar a descobrir seus talentos, terei duas maneiras de ser morto”, conta Bruno Campos, bem-humorado.
Apesar de viver em Nova York atualmente e de ter saído do Brasil ainda criança, o advogado mantém uma relação especial com o país onde nasceu. “Ele faz parte da minha história. Tenho uma camisa amarela da Seleção Brasileira, número 10, assinada pelo Pelé, emoldurada e pendurada no meu escritório. Visitei o Brasil umas 25 vezes ao longo dos anos e pude viajar por boa parte dele. Carlos Drummond de Andrade é muito especial para mim. Seus poemas estão lá em cima com os escritos mais urgentes de todos os tempos, de Gilgamés a John Lennon. Ouço com frequência as colaborações antigas de Tom Jobim com Frank Sinatra. Como comida brasileira regularmente. E profissionalmente, trabalhei com vários clientes com interesses ou casos no Brasil”, lista.
Bruno Campos não chegou a fazer a voz do príncipe Naveen na dublagem brasileira de A Princesa e o Sapo –o personagem ficou com Rodrigo Lombardi, que na época despontava como galã por seu trabalho em Caminho das Índias (2009). Mas, de todos os seus trabalhos, a animação da Disney terá para sempre um lugar especial em seu coração.
“Procurei personagens e perspectivas de roteiro que fossem um bom ajuste. Mas, no final, provavelmente me lembrarei mais de A Princesa e o Sapo. Faz parte de uma tradição icônica –o conto de fadas musical da princesa da Disney que começou com Branca de Neve na década de 1930. E minha mulher conheceu Oprah Winfrey, que estava no filme e a quem ela idolatrava há muito tempo. Oprah fez um elogio extremamente gentil à minha mulher, que, claro, chorou instantaneamente”, lembra Campos.
Luciano Guaraldo
Editor-chefe da Tangerina. Antes, foi editor do Notícias da TV, onde atuou durante cinco anos. Também passou por Diário de São Paulo e Rede BOM DIA de jornais.
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