O Mundo Depois de Nós: Entenda as mensagens misteriosas do filme

Mal estreou e O Mundo Depois de Nós, filme estrelado por Julia Roberts, Ethan Hawke e Mahershala Ali, já figura no top 10 da Netflix no Brasil. Disponível no serviço de streaming desde sexta-feira (8), a produção inspirada no livro homônimo do escritor norte-americano Rumaan Alam mostra o mundo ganhando contornos de um cenário apocalíptico após sofrer ataques cibernéticos –ou seja, o rival, aqui é desconhecido. Os EUA fizeram muitos inimigos, arrisca dizer um dos personagens do filme, vivido por Kevin Bacon.

[Atenção: esse texto contém spoilers, cuidado para não azedar sua semana!]

É um futuro distópico, mas que não parece muito longe nem tão fora da nossa realidade. Daí os gatilhos que o longa-metragem dirigido por Sam Esmail (o mesmo de Mr. Robot) despertam no espectador. E é preciso entender o contexto desses gatilhos.

Atualmente, o mundo testemunha duas guerras simultâneas –uma no Leste Europeu, entre Rússia e Ucrânia; e outra no Oriente Médio, entre Hamas e Israel. Sem sinal de trégua ou um fim, os dois conflitos trazem dor e sofrimento a quem está sendo atingido diretamente por eles, e impotência e incertezas para o restante da população mundial. Como isso poderá afetá-la? Essas guerras baterão à sua porta algum dia?

Um planeta conectado e globalizado como o nosso também está constantemente sob a iminência de ataques cibernéticos, que podem trazer prejuízos de várias ordens, incluindo profissionais ou mesmo financeiros. Sem contar nas previsões apocalípticas de estudiosos que dão conta que, em 2024, uma tempestade solar pode provocar um apagão da internet se atingir a Terra. Ou seja, o planeta ficaria desconectado. Voltaríamos a ser um mundo off-line por período indeterminado?

E não menos preocupante e urgente: as mudanças climáticas mundiais causadas pela emissão de gases poluentes, desmatamento, entre outras ações, e que têm provocado grandes catástrofes, como enchentes, invernos rigorosos e calor extremo. Reações incomuns que acendem um alerta entre especialistas e governantes, e colocam em xeque a própria sobrevivência das populações a médio e longo prazo.   

O Mundo Depois de Nós fala justamente sobre esse mundo caótico num futuro que não parece nada distante –e totalmente verossímil diante de cenários tão pessimistas projetados nos dias de hoje. Daí os gatilhos. Um misto de drama e suspense psicológico, o filme tem início com um casal, Amanda (Julia Roberts) e Clay (Ethan Hawke), decidindo passar férias na praia, com seus filhos, Archie (Charlie Evans) e Rose (Farrah Mackenzie).

Amanda aluga uma casa de luxo e tudo parece indicar que a família desfrutará de alguns dias de tranquilidade, até que um fato intrigante acontece quando eles vão à praia. Sem entender muito o que está acontecendo, eles seguem com seu dia normalmente, até que, à noite, recebem a visita inesperada de G. H. (Mahershala Ali) e Ruth (Myha’la), supostamente pai e filha, que se apresentam como proprietários da residência e que precisam pernoitar no local.

Amanda fica desconfiada. Clay é mais receptivo ao pedido. A reação distinta dos dois também indica muito o perfil de cada um. Durona, Amanda não gosta de pessoas, fala isso (ou demonstra isso) a todo mundo. Clay é claramente mais afável. Com o passar do tempo, e da escalada de incidentes estranhos que acontecem a partir dali, as duas famílias, sob o mesmo teto, precisam estabelecer uma relação de confiança para sobreviver.   

O filme traz outras camadas de discussão. Há um evidente conflito de geração estabelecida entre Clay e Amanda e sua filha mais nova, Rose. Nascida num mundo já on-line, Rose é obcecada pela série Friends (1994-2004), que foi ao ar antes de ela nascer, e se desespera quando, sob ataque cibernético, todos os dispositivos da casa onde estão hospedados ficam desconectados, o que a impede de ver o último episódio da produção. Na verdade, a essa altura, todo o mundo está desconectado.

Num mundo off-line, a salvação está nos velhos suportes físicos, como vinil e DVD. Essa parece ser uma das mensagens da obra. Há também o isolamento compulsório dos personagens, alheios ao que está acontecendo no resto do planeta, algo pelo que passamos durante a pandemia e conhecemos bem. Mais um gatilho.

Adicionado a tudo isso, estão as cenas de suspense, outras mais angustiantes e a câmera vertiginosa do diretor, que tira o público ainda mais da sua zona de conforto. Para além de todo esse debate proposto pelo filme, O Mundo Depois de Nós tem também dividido opiniões –e deixado evidente essa polarização entre quem gosta ou não do longa– porque o final dele fica aberto. O não desfecho da cena final incomodou uma parte da audiência. E está dando margem à possibilidade de que o filme ganhe uma sequência.