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Série do Star+ foi rejeitada pelas filhas do apresentador; Marcus Baldini e André Barcinski defendem o projeto e adiantam segunda temporada
Lançada no meio de outubro, a série O Rei da TV não foi bem aceita pela família de Silvio Santos –a ponto de Daniela Beyruti, “filha número 3” do comunicador, anunciar que o SBT pretende produzir uma versão própria da história. Para os criadores da atração do Star+, as críticas não chegam a ser uma surpresa. “Acho natural que pessoas ligadas ao Silvio não gostem. A série é muito respeitosa com o personagem, mas não é chapa-branca”, aponta o roteirista André Barcinski.
“O Silvio Santos sempre controlou a própria narrativa, e deve ser difícil ver outras pessoas narrando sua trajetória sem consultá-lo ou pedir sua aprovação”, continua o escritor em entrevista exclusiva à Tangerina. “A série não ‘toma partido’ de ninguém. Tratamos Silvio como uma pessoa genial, um homem que revolucionou a TV brasileira, mas também como um ser humano complexo e falível, como todos nós.”
Diretor de O Rei da TV, Marcus Baldini prefere ter sua série seja vista e criticada a vê-la completamente ignorada pelo público. “Acho que todo mundo tem o direito de achar o que quiser. A gente tem o direito de fazer, as pessoas têm o direito de gostar ou não. Eu não vejo a crítica como uma coisa nociva, mas como um diálogo que você estabelece. O que eu acho interessante é que as pessoas tenham uma opinião. Se elas gostam ou desgostam, pelo menos foram tocadas por aquilo de alguma maneira, o que para mim é melhor do que passar batido”, justifica.
“Eu acho que uma das coisas que você faz como artista é provocar discussões e emoções. E eu tento colocar essa provocação em todas as coisas que eu faço. Se a família [Abravanel] não gostou, se o Silvio não gostou… Aliás, o Silvio eu não sei se gostou, porque nem sei se ele assistiu de fato. Mas cada um tem o direito de gostar ou não, o importante é que a gente teve a liberdade artística para fazer uma obra audiovisual independente.”
Os dois têm experiência em projetos biográficos. André Barcinski roteirizou a série Zé do Caixão (2015), que trouxe Matheus Nachtergaele como o ícone do terror brasileiro José Mojica Marins (1936-2020). Já Marcus Baldini dirigiu o filme Bruna Surfistinha (2011), em que Deborah Secco deu vida à ex-prostituta Raquel Pacheco. “Fazer um produto audiovisual sobre pessoas que existem é muito interessante, é uma coisa que eu gosto. Claro que você tem de trabalhar em uma linha muito tênue entre aquilo que você pode adaptar para a dramaturgia e o que não pode”, começa o diretor.
“Na verdade, você acaba arrumando uma linha de coerência que, na minha cabeça, é sempre respeitar a essência do personagem, os seus valores mais primários e não deturpar aquilo que ele é. A gente consegue adaptar os eventos para que a dramaturgia funcione dentro daquelas coisas que o personagem talvez não tenha feito, mas faria se pudesse”, continua Baldini.
Para Barcinski, o diferencial de O Rei da TV é que Silvio Santos, ao contrário de Zé do Caixão e Bruna Surfistinha, não é um personagem que deixou outras pessoas contarem sua vida. “Ele criou a própria história. Muito do que sabemos como a verdade sobre Silvio Santos foi relatada pelo próprio Silvio, em biografias e artigos que ele próprio narrou. Então ele, de certa forma, é seu próprio biógrafo.”
Mariano Mattos Martins como Silvio Santos em O Rei da TV
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Os criadores de O Rei da TV encontraram uma solução interessante para resumir a vida de Silvio Santos –que completa 92 anos no próximo dia 12– em oito episódios: no fim dos anos 1980, o apresentador descobriu um problema nas cordas vocais e precisou se ausentar de seu programa dominical. A história, verídica, serviu de base para que o personagem (vivido por José Rubens Chachá) vivesse um momento de reflexão e relembrasse alguns dos momentos de seu passado –Silvio é interpretado por Guilherme Reis na adolescência e por Mariano Mattos Martins como jovem adulto.
“O recurso de usar narrativas em diferentes tempos não é nada novo. O importante é ter um evento central que seja crucial para o personagem, e julgamos que o problema nas cordas vocais era. Para Silvio, desde os tempos de camelô, a voz sempre foi muito importante, e tentamos imaginar o que seria dele se a perdesse”, explica Barcinski.
“É muito interessante ter uma linha mais contemplativa, do momento em que o Silvio vivido pelo Chachá está revendo tudo o que passou na vida dele, repensando sua trajetória, em contraponto com outro Silvio, aquele que o Mariano e o Guilherme fazem, que é um rolo compressor, cheio de autoestima, de desejo, com muita vontade de vencer, e que é essa locomotiva de vitórias e carisma que o Silvio foi durante a vida”, completa Baldini.
“Mas as duas linhas temporais se intercalam de forma narrativa também, a maneira como os temas são tratados entre uma e outra dialogam de um jeito interessante, que constrói um significado diferente para a existência delas. Não só pelas duas linhas separadas, mas também pelos cortes temáticos que existem entre elas”, finaliza o diretor.
A primeira temporada de O Rei da TV já está disponível completa no Star+. O segundo ano já foi gravado e deve chegar à plataforma no ano que vem. Os criadores desconversam sobre boatos de que os novos episódios vão retratar a tentativa de Silvio Santos de virar presidente do Brasil em 1989. “A série continua a partir de 1988 e tem muitas surpresas que a gente vai ver”, provoca Baldini. “O que eu posso dizer é que a candidatura do Silvio daria, sozinha, uma série. É um dos momentos mais incríveis da trajetória dele”, finaliza Barcinski.
Luciano Guaraldo
Editor-chefe da Tangerina. Antes, foi editor do Notícias da TV, onde atuou durante cinco anos. Também passou por Diário de São Paulo e Rede BOM DIA de jornais.
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