FILMES E SÉRIES

Viola Davis

Foto: Agnews/Marcelo Sa Barretto

A MULHER REI

Viola Davis critica racismo no cinema: ‘Pretas são secundárias’

Atriz veio ao Brasil para divulgar o lançamento de A Mulher Rei; filme estreia nos cinemas nesta quinta-feira (22) e coloca a estrela em cenas de ação

André Zuliani

Vencedora do Oscar e do Emmy, Viola Davis veio ao Brasil para divulgar a estreia de seu novo filme, A Mulher Rei, que chega aos cinemas nesta quinta-feira (22). No longa, a atriz de 57 anos vive uma guerreira africana e protagoniza as primeiras cenas de ação de sua carreira.

Embora tenha uma carreira aclamada em Hollywood e seja considerada uma das principais atrizes dos últimos anos, Viola ainda enfrenta o racismo da indústria. Em bate-papo com jornalistas realizado nesta segunda do qual a Tangerina participou, a estrela de A Mulher Rei explicou como o preconceito afeta não apenas a trajetória de artistas pretas como também exclui histórias protagonizadas por elas no cinema.

“Infelizmente, o racismo ainda atinge. Isso criou um sistema que te trata baseado em quem você é, no seu sexo e cor, e as mulheres pretas estão no último lugar desta lista. Nós sempre somos vistas como uma advogada ou médica sem nome. Mulheres fortes, que fazem piadas ou dão conselhos sábios. Nós somos colocadas em uma caixa”, disse Viola.

“Sempre que eu vejo uma mulher negra em filme, eu me pergunto quem ela é. Quando vejo, ela já sumiu [de cena]. Eu estou cansada disso. Na minha vida, eu sei quem são essas mulheres. Elas são muitas e complicadas. São lindas, divertidas, às vezes não são mães ou tias. Eu sei seus nomes. Eu queria que mulheres negras fossem humanizadas como todos os outros. Se fossem erradicar o racismo, esse é o primeiro passo. É entender que somos todos seres humanos, nós não somos uma metáfora. Não é possível fazer isso sem criar narrativas para mostrar.”

Julius Tennon e Viola Davis

Julius Tennon e Viola Davis em evento de A Mulher Rei

Foto: Agnews/Marcelo Sa Barretto

Para ilustrar o seu ponto, Viola usou o exemplo de atrizes brancas de sucesso mundial, como Meryl Streep (O Diabo Veste Prada), Helen Mirren (A Rainha) e Julianne Moore (Para Sempre Alice). O trio de vencedoras do Oscar ganham personagens fortes praticamente todos os anos, enquanto atrizes pretas são quase sempre escanteadas para papéis secundários.

“O motivo de elas serem grandes é porque tiveram a oportunidade de mostrar isso. Se a arte imita a vida, é porque nós sentimos que elas mereceram isso. Eu, como mulher preta, sinto que não mereço. Isso é enfatizado em todo lugar. Eu me lembro de uma pessoa que me disse do completo nada: ‘Você sabe que não é bonita, né?’. A razão de eles [brancos] poderem dizer isso e saírem impunes é o motivo de eu e Julius [Tennon, produtor de A Mulher Rei] estarmos colocando mulheres negras nas narrativas”, completou.

Para Viola, a falta de mulheres pretas no protagonismo do cinema aumenta ainda mais a importância de um filme como A Mulher Rei. Sem o exemplo da arte e das histórias de ficção, ela acredita que será mais difícil de o mundo aceitar atrizes como ela em papéis importantes.

“Ver personagens como as do nosso filme é muito importante. A arte imita a vida, então precisamos ver isso na arte. Não é mais aceitável ver como as pessoas nos veem. Eu tenho esse valor, me desculpem. Eu tenho o mesmo valor que Meryl, Helen e Julianne. Não me importa que eu não seja loira ou não use um número de roupa menor. Eu tenho valor e os filmes precisam refletir isso.”

Viola Davis em cena de A Mulher Rei

Viola Davis em cena de A Mulher Rei

Divulgação/Sony Pictures

Reparação histórica

Em A Mulher Rei, Viola Davis interpreta Nanisca, general de uma unidade de guerreiras do reino de Daomé, um dos estados mais poderosos da África nos séculos 18 e 19, conhecidas como Agojie. Fortes e extremamente hábeis em combate, elas são a principal força comandada pelo rei Ghezo (John Boyega).

Embora sejam parte importante da cultura africana, as Agojie são pouco citadas nos livros de história ocidentais. Seus feitos e lendas, no entanto, são representados na ficção em um grupo bastante conhecido da cultura pop: as amazonas, guerreiras cujo principal nome é ninguém menos do que a Mulher-Maravilha.

Nos livros, as amazonas quase sempre são descritas como mulheres brancas, altas e belas. Descrição esta que é fruto da visão eurocentrista dos historiadores que retratam grandes heróis sempre com a cor de pele e olhos claros. Para Viola, A Mulher Rei funciona como uma reparação história para as guerreiras africanas.

“Eu sempre conheci as amazonas, mas só fui conhecer as Agojie pelo filme. ‘Amazonas’ é uma expressão de colonizador. Eu só as conheci em 2018, quando comecei a preparação para o longa. Dê o nome de verdade das amazonas, que são as Agojie. Elas eram mulheres descartadas e que ninguém queria. Recrutadas entre oito e 14 anos. Muitas delas eram decapitadas caso não quisessem se tornar Agojie”, contou Viola Davis.

“Ou você perdia a cabeça ou se tornava Agojie e não poderia casar e ter filhos. Como atriz, eu sempre me pergunto como buscar um jeito de viver assim [como a personagem], como sobreviver a isso. Como achar algo bonito nisso. No roteiro escrito por Dana Stevens, elas tinham orgulho de defender o reino, isso lhes dava um propósito. Para mim, foi um meio de contar essa história enquanto artista. Há poucas informações sobre as Agojie, então busquei um jeito de as valorizar.”

Além de Viola Davis e John Boyega, o elenco principal do longa também conta com Lashana Lynch (Capitã Marvel), Thuso Mbedu (The Underground Railroad), Adrienne Warren (Women of the Movement), Sheila Atim (Pinóquio), Jayme Lawson (The First Lady) e Hero Fiennes Tiffin (After).

Viola Davis em cena de A Mulher Rei

A Mulher Rei

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QUEM FEZ

André Zuliani

Repórter de séries e filmes. Viciado em cultura pop, acompanha o mundo do entretenimento desde 2013. Tem pós-graduação em Jornalismo Digital pela ESPM e foi redator do Omelete.

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