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O ator Marcos Palmeira caracterizado como José Leôncio em Pantanal

Reprodução/TV Globo

FARSA VERDE

Greenwashing: Por que Zé Leôncio se pinta de verde em Pantanal?

A culpa de José Leôncio (Marcos Palmeira) em ter um império agropecuário é uma espécie de greenwashing na novela Pantanal?

Daniel Farad

José Leôncio (Marcos Palmeira) trouxe mais uma vez à tona a culpa por ter criado um império agropecuário em Pantanal. Ele confessou a Jove (Jesuita Barbosa) sentir-se mal por aplicar práticas de mercado em suas propriedades para sustentar o manejo sustentável na principal fazenda –justamente a que serve de cenário para a novela das nove da Globo.

O pecuarista fez um mea-culpa diante de mais críticas do filho, que disse não compactuar com a forma como os negócios da família são levados à frente no capítulo de segunda (20). “Será que é essa toada que seu avô Joventino [Irandhir Santos] queria que eu seguisse? Eu sempre o senti esses anos todos. Mas quando eu estou aqui nesta empresa, eu não sinto mais ele”, revelou o peão.

O personagem de Marcos Palmeira faz referência aos ensinamentos quase estoicos que recebeu do pai, cuja ligação com a natureza é tão grande a ponto de ele ter se transformado em parte dela. O patriarca deixou a sociedade para virar o Velho do Rio (Osmar Prado), um dos seres encantados que protege o bioma.

José Leôncio, então, preservaria a primeira fazenda da família, a que ainda recebe a visita do espírito do velho Joventino, em uma espécie de paraíso. Ele já se recusou a trocar os cavalos por quadriciclos, a aumentar a produção com agrotóxicos e aceitou até mesmo a perder dinheiro por lá –contrariando a lógica básica do capitalismo.

Mas o discurso do fazendeiro, na prática, é outro. A Fazenda Pantanal não tem características assim tão significativas que a separe das demais propriedades, a não ser por praticar o que é chamado de “economia verde”. Esse sistema é apontado por uma série de críticos e teóricos como uma falsa alternativa à degradação do meio ambiente e às mudanças climáticas.

Ecocapitalismo em Pantanal

O xis da questão é que Pantanal naturaliza relações que são próprias do sistema econômico em que vivemos como se fossem inatas aos seres humanos. Esse movimento não é necessariamente consciente do autor Bruno Luperi, mas uma tendência que se mostra cada vez mais forte dentro das narrativas culturais –a do realismo capitalista.

O crítico britânico Mark Fischer cunhou a expressão para explicar por que é mais fácil imaginar o fim do mundo do que o fim do capitalismo. José Leôncio se enquadra nessa dicotomia ao propor a sua propriedade modelo como um símbolo de sustentabilidade, mesmo que ainda dentro de um sistema que é baseado na exploração de seres humanos e da natureza.

Afinal, a utopia dos Leôncio não é necessariamente tão fora da realidade assim. A Fazenda Pantanal continua como um latifúndio voltado a uma única atividade –no caso, a criação de bois marruás– numa estrutura que repete basicamente a exploração da terra desde que os primeiros portugueses chegaram ao Brasil no século 15.

Qual é a mudança real proposta por José Leôncio em sua principal propriedade? Até agora, as medidas parecem mais mitigar os impactos da indústria agropecuária no meio ambiente do que propor alguma virada de paradigma. Pantanal, neste sentido, parece sofrer com um greenwashing –um banho de marketing para tornar verde um produto que, no fundo, faz mais parte dos problemas do que das soluções.

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QUEM FEZ

Daniel Farad

Repórter. Além do Notícias da TV, também se juntou ao Tangerina para combater a mesmice e o escorbuto. Escreve do Rio de Janeiro, onde se sente eternamente em uma novela do Manoel Carlos. Aqui, porém, a gente fala mexerica. Fale com o Daniel: vilela@tangerina.news

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