MÚSICA

A banda britânica Hot Chip posa para foto

Divulgação/Pooneh Ghana

Freakout/Release

‘Purgatório estranho’: Como o Hot Chip fez dance music na pandemia

Joe Goddard conversou com a Tangerina sobre o novo álbum, Freakout/Release, e o show que a banda fará no GPWeek, em SP

Luccas Oliveira
Luccas Oliveira

Dono do hino das baladas alternativas Ready for the Floor, o Hot Chip lança seu oitavo disco de estúdio nesta sexta-feira (19). Freakout/Release tem 11 faixas e já está disponível nas plataformas de streaming. É com ele que a banda britânica volta ao Brasil em novembro, como atração do GPWeek, festival em São Paulo que terá ainda The Killers, Twenty One Pilots, entre outros.

A pandemia permitiu ao Hot Chip um tempo maior de criação para Freakout/Release, o que resultou em mudanças no processo de composição. Por exemplo, pela primeira vez a banda criou o álbum com todos os integrantes reunidos no estúdio e participando ativamente do processo. Antes, os vocalistas e fundadores do grupo, Joe Goddard e Alexis Taylor (respectivamente, os últimos dois em pé, à direita, na foto acima), centralizavam as composições.

No entanto, o lockdown também trouxe desafios, como o de criar músicas dançantes durante uma pandemia global.

“Um produtor trabalha melhor quando tem o feedback do público na pista. Isso ajuda a criação”, contou Goddard em entrevista exclusiva à Tangerina. “A faixa Time, do disco, fala disso. Sobre estar nesse purgatório estranho do qual você não sabe quando vai sair e conseguir viver de uma maneira satisfatória. Então, sim, [a pandemia] inspirou o álbum de várias maneiras.”

Goddard ainda adiantou o que o público brasileiro pode esperar do show no GPWeek. “Somos um grupo empolgante, que é muito bom em fazer dance music que soa muito orgânica e de verdade”, resumiu. “Obviamente, o The Killers meio que aborda algumas dessas coisas, também. Acho que vamos nos complementar bem, nesse sentido.”

Dê o play em Freakout/Release enquanto lê nosso papo com Joe Goddard, do Hot Chip.

Acabamos de saber que o Hot Chip vem para o Brasil pela sexta vez!

Sim! Estamos muito felizes e empolgados. Amamos o país. Tivemos muitas experiências especiais aí ao longo dos anos, shows divertidos, ótimos públicos. Sempre lembramos, então é ótimo poder voltar. Amo a comida, a cultura, a música. A única parte difícil é que temos pouco tempo no país e sempre queremos ficar mais.

A primeira vez que o Hot Chip veio foi há 15 anos. Lembra-se de algum episódio especial das turnês por aqui?

Teve um festival que fizemos, não lembro exatamente qual. Mas era um show bem tarde, acho que em São Paulo. Estávamos no meio de uma das nossas músicas quando a luz acabou totalmente, um silêncio total no palco, mas o público seguiu curtindo. Eles começaram a meio que dançar sem música, numa espécie de coreografia em silêncio, uma salsa ou algo assim. Foi a melhor resposta possível, foi muito legal ver o público se curtindo mesmo sem música. E então a energia voltou, nós retomamos a música de onde parou e virou um grande momento de alegria.

[Pela descrição, Joe está falando do show no festival Sonár São Paulo, em 2015, quando o Hot Chip tocou às 3h20 da manhã]

Agora, vocês vão tocar num festival com The Killers e Twenty One Pilots. Certamente, muitas pessoas do público não vão conhecer a banda. O que o Hot Chip pode levar para um evento deste tipo?

Acho que pode ser divertido mesmo para quem não conhece nossas músicas. Somos um grupo empolgante, que é muito bom em fazer dance music que meio que soa muito orgânica e de verdade. Espero que a gente consiga levar um pouco dessa energia e desse espírito das músicas dançantes para um evento como este. Obviamente, o The Killers meio que aborda algumas dessas coisas também. Acho que vamos nos complementar bem, nesse sentido.

A banda britânica Hot Chip posa para foto

Assista ao clipe de Down, do Hot Chip

Faixa foi o primeiro single do novo álbum

Vocês chegam com um novo álbum, Freakout/Release. Que tipo de novas camadas ou elementos ele traz ao show?

Estamos começando a incluir as novas músicas ao show agora. Faixas como Down e Freakout/Release já entraram, e a segunda definitivamente cria uma energia diferente no show. Ela traz um riff de guitarra muito inusitado, é quase como se fosse o riff de uma música do Black Sabbath ou algo do tipo. Então, ela se desenvolve uma espécie muito barulhenta de agudo, que é diferente de qualquer coisa que fizemos no passado. Vira um momento de realmente pirar, um free jazz com uma energia meio punk, de verdade.

Todas as vezes que a tocamos, percebi a diferença no público. As pessoas gostam desse espírito mais punk entrando na nossa música, e vamos tentar manter essa pegada em outras canções dos shows.

Eu li que, depois de tanto tempo, essa foi a primeira vez que o Hot Chip reuniu todos os integrantes juntos num estúdio para gravar um álbum. Por que optaram por essa abordagem agora? E o que ela trouxe ao disco?

Por exemplo, a faixa Down. Eu levei o sample que tem nela para o estúdio. Não tínhamos escrito nada além daquilo, só o sample que eu achava que seria legal se usássemos como gancho. Estávamos todos no estúdio, menos o Felix [Martin]. Ficamos brincando e tocando a partir daquele sample até sair a música. E não é uma coisa que fazíamos antes. Era mais eu e Alexis [Taylor] levando demos já compostas. Agora, tivemos muito tempo no estúdio por conta da pandemia e optamos por tocar mais juntos, experimentar coisas juntos. Tentamos replicar os Beastie Boys quando criavam juntos em seu estúdio de Los Angeles, se divertindo e experimentando.

O cover de Sabotage, dos Beastie Boys, que vocês fazem nos shows, também é citado como uma grande inspiração para Freakout/Release.

Temos tocado esse cover nas turnês há um tempo e a gente sempre se diverte muito. Mas é uma energia muito diferente das nossas outras músicas, outra velocidade, e tem esse espírito punk, hardcore, que citamos antes. Então, no disco, tentamos capturar um pouco desse clima, porque era agradável. Especificamente as faixas Down e Freakout/Release, que debatemos aqui, foram sonoramente inspiradas por Sabotage. Não é tão evidente em outras, mas o espírito estava lá.

Como foi criar dance music durante uma pandemia global?

Foi muito difícil e afetou muita gente, especialmente nossos amigos DJs. Um produtor de música eletrônica trabalha melhor quando tem o feedback do público na pista. Isso ajuda a criação. Nossa ideia era criar coisas empolgantes para o momento no futuro em que pudéssemos nos reunir e dançar juntos de novo. Queria ter algo novo e legal para tocar numa festa de retorno, que pudéssemos pirar e aliviar nossas tensões. A faixa Freakout/Release nasceu assim.

Então podemos dizer que o disco foi inspirado pela pandemia?

Sim, e acho que para praticamente todos os artistas. Você não pode passar por algo como uma pandemia e não ser influenciado por ela de alguma maneira. Consumiu nossas vidas. E nenhum de nós sabia exatamente o quanto ia durar. A faixa Time, do disco, também fala disso. Sobre estar nesse purgatório estranho do qual você não sabe quando vai sair e conseguir viver de uma maneira satisfatória. Então, sim, inspirou o álbum de várias maneiras.

A banda britânica Hot Chip posa para foto

Ouça a faixa Freakout/Release

Faixa dá nome ao oitavo disco do Hot Chip

O quão diferente é compor e lançar músicas dançantes hoje em relação a 18 anos atrás, quando vocês começaram?

Esta é uma questão interessante. Porque, de alguma forma, a dance music mudou muito. Existem permutações diferentes, novos gêneros e andamentos que as pessoas usam hoje e não usavam há 18 anos. Mas, ao mesmo tempo, a dance music tem diversas constantes, assim como os fundamentos da house music e do techno já existem há muito tempo. Começaram na década de 1980 e ainda são usados e apreciados hoje em dia por quem frequenta e faz dance music.

Então, nós apenas tentamos combinar muitas dessas coisas que Marshall Jefferson ou outras lendas criaram lá atrás com o que tem rolado na dance music atual, em selos como a Hessle, enquanto fazemos as músicas do Hot Chip.

É legal ver artistas como Drake e Beyoncé lançando house music hoje?

Eu não tenho qualquer problema com isso. Eu estava tocando como DJ numa festa de house music há algumas semanas e um amigo tocou Break My Soul. Funcionou muito bem no contexto daquela festa, soou bem demais. Acho que Beyoncé fez o trabalho de casa dela e chamou ótimas pessoas para o disco, como Paul Woolford e Luke Solomon, verdadeiros amantes da dance music. E eles fizeram um ótimo trabalho no disco [Renaissance]. Beyoncé não é a minha artista favorita no mundo, eu não ouço as músicas dela o tempo todo, mas tenho um grande respeito. E não estou incomodado por ela estar fazendo house music, honestamente.

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Luccas Oliveira

Luccas Oliveira

Luccas Oliveira é editor de música na Tangerina e assina a coluna Na Grade, um guia sobre os principais shows e festivais que acontecem pelo país. Ex-jornal O Globo, fuçador do rock ao sertanejo e pai de gatos, trocou o Rio por São Paulo para curtir o fervo da noite paulistana.

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