Rodrigo Gianesi
Em São Paulo, festival passou no teste da estreia e entregou boa organização, pontualidade e, acima de tudo, grandes shows; agora, ele segue para o Rio de Janeiro
Ao menos em São Paulo, o MITA Festival passou pelo teste da estreia. O evento recebeu 34,5 mil pessoas em dois dias, teve mais acertos do que perrengues e deu palco a shows memoráveis. Além disso, o MITA ainda apresentou a Spark Arena, na Vila Leopoldina, como uma boa opção para festivais de médio porte na capital paulista.
Agora, a caravana segue para o Rio de Janeiro. O MITA Festival aporta no Jockey Club Brasileiro nos dias 21 e 22 de maio, com praticamente a mesma programação —ainda há ingressos à venda. Gorillaz, Rüfüs du Sol, Gilberto Gil, Two Door Cinema Club e outros ganham a companhia de The Kooks, Jão, Alice Caymmi e Marcos Valle + Azymuth, que não se apresentaram em São Paulo. Por outro lado, o Rio não terá Luedji Luna, Matuê e Marina Sena.
Ah, e na Cidade Maravilhosa haverá transmissão ao vivo do line-up pelo Multishow. No entanto, se seguir a linha de organização do primeiro fim de semana, Na Grade indica o MITA Festival como uma boa pedida para os cariocas e possíveis turistas.
A estrutura do festival em São Paulo funcionou bem, com bares espalhados pela Spark Arena, diversas opções gastronômicos, uma pontualidade excepcional e ótimo sistema de som. Foi fácil circular entre os dois palcos do MITA Festival sem correr risco de perder qualquer pedaço do show. Além disso, os dois headliners —Rüfüs du Sol e Gorillaz— terminaram seus shows antes das 22h.
Por outro lado, uma crítica deve ser feita: os preços para consumação. Cobrar R$ 16 num copo de chopp, tendo uma marca de cerveja como patrocinadora do evento, é difícil de entender. Algumas semanas antes, a mesma marca de cerveja patrocinou o Balaclava Fest em São Paulo, e uma lata saía por R$ 12. E não estamos falando de um festival cujos ingressos eram acessíveis, exatamente.
Isso dito, vamos ao que importa.
O Gorillaz entregou um show de headliner com H maiúsculo. Projeções incríveis no telão (com direito a um Elton John “a la Gorillaz” em The Pink Phantom), banda grande com sonoridade impecável, setlist irretocável, Damon Albarn inspiradíssimo pulando na multidão diversas vezes…
Além disso, ainda teve surpresa: o lendário trio de hip hop De La Soul veio com a trupe do Gorillaz ao Brasil para cantar Superfast Jellyfish e o hit Feel Good Inc. Até Marcelo D2, que cantou horas antes, se disse emocionado por ter visto os ídolos no backstage.
Banda e público estavam na mesma sintonia, naquela troca de energias que é rara de se ver. Foi um show para aguçar diversos sentidos da plateia, e será lembrado por anos.
No sábado, Gilberto Gil fez um show marcado por emoções no MITA. O mestre da MPB, que completa 80 anos em junho, está voltando agora aos palcos, depois da pandemia, e esbanjou vitalidade artística em São Paulo. Clássicos como Drão e Toda Menina Baiana embalaram o público em coros lindíssimos.
Gil foi acompanhado pelo filho e produtor Bem Gil, pelo baterista Marcelo Costa, o guitarrista Guilherme Lírio e por Flor Gil, sua neta de apenas 13 anos. Ao longo da pandemia, a dupla viralizou com vídeos fofos nas redes sociais, cantando juntos. E levaram isso para o palco do MITA. Flor esteve no teclado e fazendo backing vocal durante todo o show. Além disso, brilhou cantando I Say a Little Prayer, clássico eternizado por Aretha Franklin. Ovacionada pelo público, a adolescente foi às lágrimas. “É o primeiro festival da Florzinha”, explicou o vovô imortal da Academia Brasileira de Letras (ABL).
Foi no mínimo inusitado saber que o Two Door Cinema Club viria ao Brasil sem o vocalista Alex Trimble, vetado por médicos. Mas o fato é que o substituto, David Clements, fez bonito no palco do MITA. Com timbre semelhante ao do titular e boa presença de palco, Clements foi um grata surpresa para os fãs da banda, que cantaram com afinação e volume hits indie como What You Know e Do You Want It All?.
Letrux brincou algumas vezes que o seu show, marcado para 13h35, era de manhã. Repetiu “bom dia” ao público, disse que ficava afetada nas manhãs etc. Os fãs, no entanto, chegaram cedo para curtir o baile matutino da cantora, compositora e atriz carioca.
Com o show do disco Aos Prantos, Letrux renova e melhora seu poder de palco, acompanhada agora por uma banda ainda mais numerosa e com a grata inclusão de percussão, num diálogo incrível com teclados e guitarra. Tente pegar esse show na sua cidade.
Para muitos que não conheciam, o músico britânico entregou um cartão de visitas e tanto em sua estreia no Brasil. Aos 26 anos, ele sabe usar seu estofo como produtor para explorar diferentes timbres, camadas e caminhos em um show extremamente dinâmico e com uma banda que sabe executar as ideias ali propostas.
Do nu jazz ao neo soul, passando pelo hip hop e pelo funk, Misch e companhia promoveram um baile e tanto, centrado no groove. Que seja a primeira de muitas.
E não foi só o Gorillaz que entregou surpresas no domingo. O trapstar Matuê se divertiu tanto no palco quanto o público que o assistia, e ainda fez questão de levar o pupilo Teto para o palco. O jovem entrou para cantar M4, uma das primeiras parcerias entre os dois, lançada em 2021.
Além disso, o cearense ainda fez questão de homenagear o ídolo Chorão, do Charlie Brown Jr, no show. “Em memória do Marginal Alado”, dizia o telão, enquanto se ouvia a voz do roqueiro de Santos no sistema de som.
Não foi só Gilberto Gil quem promoveu um encontro familiar no palco do MITA Festival. O carioquíssimo Marcelo D2 também teve a companhia da mulher, a produtora Luiza Machado, e do filho Sain. O rapper soube driblar alguns problemas técnicos e foi ganhando o público na base do carisma e de ritmos como 1967 e Qual É. Ainda rolou a “coincidência” de o relógio passar pelas 16h20, quando D2 fez questão de mandar um recado carinhoso para o presidente Jair Bolsonaro.
Amigas e futuras parceiras de palco Sunset no Rock in Rio, Luedji Luna e Liniker se apresentaram no sábado e no domingo, respectivamente. No mesmo palco e horário, inclusive. Cada uma na sua, elas mostraram o repertório de seus discos mais recentes, acompanhadas por bandas majoritariamente pretas. Em comum, a habilidade ímpar que elas têm de transitar entre a potência de suas vivências e a calmaria de suas sonoridades.
No domingo, Luedji ainda surgiu na grade para assistir ao show da amiga.
“Toca na pista, toca na favela”, diz a letra de um dos maiores sucessos do Heavy Baile, numa parceria com Tropkillaz e MC Carol. Esse foi um dos muitos momentos marcantes do show frenético que o coletivo carioca realizou no MITA Festival, centrado no funk e na cultura do passinho. Quase sem tempo para deixar o público respirar, a trupe comandada pelo MC Tchelinho passou por hits próprios e clássicos. Ferveu!
Para quem assistiu a shows do rapper fluminense Black Alien pré-pandemia, talvez o do MITA Festival não tenha tido muitas novidades. O repertório segue parecido, centrado no disco Abaixo de Zero: Hello Hell e em alguns sucessos da carreira. Ainda assim, é um show que não passa desapercebido, pelo poder da caneta de compositor de Gustavo, seu flow inigualável e a sintonia com o publico.
E o rapper estava numa tarde de sábado muito bem humorada, repetindo diversas vezes o quão “felizão” ele estava por lá.
A jovem mineira ainda está entendendo esse lance de ser popstar, apesar de parecer ter nascido para isso. No palco, Marina Sena é engraçada e performática, sabe se comunicar com palavras e gestos. No MITA Festival, não foi diferente. Mas, depois de ter visto um show ainda mais potente no Rock the Mountain há um mês, esta coluna prefere shows da Marina à noite.
Luccas Oliveira
Luccas Oliveira é editor de música na Tangerina e assina a coluna Na Grade, um guia sobre os principais shows e festivais que acontecem pelo país. Ex-jornal O Globo, fuçador do rock ao sertanejo e pai de gatos, trocou o Rio por São Paulo para curtir o fervo da noite paulistana.
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