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A série da Netflix, que ganha segunda temporada em breve, é um escape água com açúcar pra quem quer fugir da realidade. E ver pessoas lindas
Com a proximidade da estreia de sua segunda temporada, o coração começa a reaquecer para a novela mais deliciosa da Netflix: Bridgerton. A série é basicamente um melodrama desses água com açúcar, com atores atraentes e referências pseudo históricas, praticamente um refresco para quem está cansado da realidade e quer apenas assistir algo para relaxar e se divertir.
Escrita por Chris Van Dusen e produzida pela poderosa produtora Shonda Rhimes, em sua primeira parceria com a Netflix, é preciso admitir logo de cara que Bridgerton não é uma obra de alto nível. A série não tem uma personalidade única nem acurada ao abordar a alta sociedade da Inglaterra de 1800, tanto em relação à riqueza das tramas quanto do ponto de vista técnico. Entretanto, surpreende exatamente quem não cria expectativas de assistir nada além de uma boa novela. Em um país que consome muito do gênero, não é de se espantar que ela tenha tido tanto sucesso.
A série funciona muito bem em relação ao entrosamento entre os atores, as brincadeiras com a atualidade e assuntos que ainda hoje geram debates, como gênero, sexualidade e comportamento. Com um elenco sem grandes estrelas conhecidas pelo público, Bridgerton traz uma história com narrativa cheia de sexo, cenas luxuosas e muita fofoca. Tudo muito colorido, engraçado e sexy.
O clima no set de Bridgerton é super leve e divertido
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Baseada na série de livros de Julia Quinn, chamada exageradamente de “a Jane Austen contemporânea”, a primeira temporada apresenta personagens do primeiro livro, O Duque e Eu, com algumas diferenças pontuais, como uma apresentação mais abrangente da família, por exemplo. Ainda assim, nesta primeira temporada temos, assim como no livro, a história da filha mais velha e quarta dos oito irmãos Bridgerton, Daphne (Phoebe Dynevor), agora se apresentando para a sociedade e em tempo de conquistar um marido, como se esperava que todas as boas garotas de seu tempo fizessem.
Em sua apresentação para a rainha, ela é favorecida e listada nas fofocas palacianas como o “Diamante” desta temporada. O trabalho de seu irmão mais velho e chefe da família, Anthony (Jonathan Bailey), é ajudar Daphne a encontrar um par adequado, mantendo assim a tradição familiar. Acontece que Daphne conhece o arrogante Duque Simon Basset (Regé-Jean Page), que tem aversão a casamentos e compromissos. Ambos fazem um acordo para fingir um namoro, com a intenção de fazer Daphne parecer mais desejável para seus reais pretendentes e manter Simon fora de um sistema de mães que desejam empurrar suas filhas para ele. Durante esse namoro falso, o ódio mútuo se transforma em amizade, e como em todo bom romance, em um amor “complicado”.
Partindo desta premissa, o drama se desenvolve para outros temas como a juventude de Simon, seu relacionamento com seu pai e a razão de ele não querer ter filhos e constituir família, por exemplo. Isso fornece à história a angústia clássica dos romances de época e os obstáculos ou impedimentos para a felicidade plena do casal central.
Há também as histórias paralelas dos outros irmãos Bridgertons, todos os oito batizados em ordem alfabética, além de seus amigos e vizinhos, que também são apresentados e têm participações importantes para a trama.
Marina Thompson e sua trágica história de amor.
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Uma personagem que ilustra estes paralelos entre livro e série, na primeira temporada, é Marina (Ruby Baker) uma prima dos Featherington. O enredo sobre seu amor pelo soldado George Crane ser trágico e ela ter que se casar com seu cunhado, Phillip é semelhante ao relatado nos livros. Os Bridgertons tinham uma prima chamada Marina que se casou com um Phillip Crane depois que George foi morto em Waterloo, mas a dinâmica é diferente na série, o que acaba fazendo a ponte entre os Bridgertons e os Featherington a partir desta narrativa logo de início.
O tratamento de Shonda Rhimes para um romance britânico fictício da era da regência histórica faz da série, que possivelmente seria classificada como um daqueles romances vendidos em supermercado, uma peça deliciosa para esta geração.
“Eles criaram um mundo muito, muito vibrante”, afirmou a autora Julia Quinn sobre a adaptação da Netflix “Sou judia e quando lia um livro e um dos personagens era judeu, eu ficava tipo: ‘Ah, sou eu’. E foi muito poderoso”, explica ela. “E agora eu sinto que sou capaz de começar a extrapolar isso e dizer, ‘Sabe de uma coisa? Todo mundo precisa disso, precisa se reconhecer” afirmou a autora para a People.
Shonda Rhimes nos apresenta seu universo como uma verdadeira democracia racial. Ao adaptar os livros, em vez de preencher aquele cenário opulento do século 18 com pessoas brancas e sem nenhuma menção à servidão que eles obrigavam aos demais povos, Bridgerton traz uma representatividade autêntica, como jamais poderíamos sonhar em uma novela brasileira, que tem uma população de maioria negra.
Com exceção de Grey’s Anatomy, uma caraterística do trabalho de Shonda é a construção de uma linha narrativa em que o racismo parece superado, como em Scandal e How to Get Away With Murder. No caso de Bridgerton, o roteiro chega a explicar a causa, tamanha estranheza que ver negros circulando na alta sociedade de 1800 pode causar. A razão, segundo Shonda, seria que a escravidão aconteceu, mas teve outro desfecho devido ao casamento interracial entre a rainha (Golda Rosheuvel). e o Rei George III. O que poderia ter ocorrido de verdade, mas infelizmente não aconteceu.
Mas não se engane nem acredite que, de alguma forma, a série é um retrato historicamente preciso da era que retrata. Apesar dos elementos terem sido claramente bem pensados para unir fases históricas, a série faz questão de lembrar ao espectador que é uma fonte fiel apenas no que tange a fantasias extravagantes, amantes adoráveis, fofocas e mistério.
A segunda temporada vai se focar em Anthony Bridgerton
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Uma das características mais questionáveis quando falamos sobre esta série está ligada às escolhas de estilo visual, com perceptível incoerência com o período retratado historicamente. Neste sentido, a série adota todo o tipo de liberdade estilística, com exuberância das cores para o figurino: enquanto as produções de época investem em vestidos com cores mais sóbrias, sem decotes e cortes mais simples, Bridgerton traz cores vibrantes e alegres presentes nos vestidos e nas roupas dos personagens. Só para esta primeira temporada, a série teve de produzir quase 7 mil figurinos, segundo a Netflix.
Além disso, várias músicas modernas ganham covers clássicos na primeira temporada; Ariana Grande: Thank U, Next (2018), Maroon 5 feat. Cardi B: Girls Like You (2018), Shawn Mendes: In My Blood (2018), Billie Eilish: Bad Guy (2019), Taylor Swift: Wildest Dreams (2015) e Strange de Celeste.
Tudo isso colocado, é preciso dizer que seguimos muito na expectativa das novas temporadas, já confirmadas pela Netflix, e por entrar novamente neste universo em que todes podem ser da nobreza independente da cor da pele. Porque esta é a representatividade que há tanto tempo procuramos por aí. E, mesmo com todas as críticas possíveis, Bridgerton é divertida e vale a pena ser conferida.
Leva que tá doce! Diversidade racial, sexualidade, feminismo, fantasia, período histórico.
Dois pelo preço de um: Gostou de Bridgerton? Vai curtir Outlander, Anne with an E
Presta atenção, freguesia: Nos figurinos, na trilha sonora e na narradora, estilo Gossip Girl.
Fernanda Alcântara
Fernanda Alcântara é jornalista, mestre em comunicação, mulher negra, mãe da Helena e amante de cartuns nacionais. Aprecia séries, filmes e a arte de criticar tudo.
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