Zé Carioca, 80: Papagaio foi ‘diplomata’ da Disney na guerra

Há exatos 80 anos, em 24 de agosto de 1942, estreava a animação Alô, Amigos, que marcou a estreia do Zé Carioca no universo da Disney. Apesar de o personagem até hoje aparecer nos quadrinhos –e, com menos frequência, em animações como DuckTales (2017-2021), boa parte do público nem imagina que o papagaio foi criado como um esforço diplomático dos Estados Unidos em plena Segunda Guerra Mundial (1939-1945).

É que, na época do conflito, o Brasil era governado por Getúlio Vargas (1882-1954), que não escondia sua admiração pelo modelo fascista vigente na Itália de Benito Mussolini (1883-1945). Apesar disso, o país havia declarado neutralidade e optado por não tomar partido no duelo entre Aliados e Eixo. E ter “vizinhos” em cima do muro era uma situação que incomodava os norte-americanos.

Franklin Roosevelt (1882-1945), então presidente dos EUA, iniciou a chamada Política da Boa Vizinhança, na qual prometia vantagens para países da América Latina –em troca de apoio na guerra, é claro. Uma das “armas” para agradar aos vizinhos latinos era prometer uma mudança na percepção que os norte-americanos tinham dos outros países do continente.

Foi nessa época que Carmen Miranda (1909-1955) se tornou uma estrela de Hollywood e um cartão-postal do Brasil para o mundo –apesar de a pequena notável ter nascido em Portugal. Walt Disney (1901-1966) e outros ícones da cultura norte-americana também foram enviados para visitar nosso país, em uma tentativa de convencer o governo de Getúlio a descer do muro.

Walt Disney esboçou o papagaio em 1941, durante sua visita ao país, hospedado no Copacabana Palace. Um ano depois, Zé Carioca já estava nos cinemas, apresentando o amigo Donald à cachaça brasileira e ao samba, ao som de Aquarela do Brasil e Tico-Tico no Fubá, no já citado Alô, Amigos.

A animação se provou tão popular que, rapidamente, Zé Carioca voltou aos cinemas em Você Já Foi à Bahia? (1944). Mais uma vez, ele servia de guia turístico para Donald, em um passeio pela América Latina que também incluía o mexicano Panchito (outra criação da Política da Boa Vizinhança para mostrar os acenos dos Estados Unidos aos vizinhos do sul). Na falta de Carmen Miranda, o longa conta com sua irmã, Aurora (1915-2005), devidamente creditada como Aurora Miranda do Brasil –mais populista, impossível.

O trio formado por Donald, Zé Carioca e Panchito caiu no imaginário popular da população norte-americana, e até hoje é raro ver uma representação do papagaio brasileiro por lá que não envolva o pato irritadiço e galo mexicano dono de um serapé voador, coletivamente conhecidos como Los Three Caballeros.

No Brasil, a popularidade do papagaio é bem maior, e ele ganhou toda uma turma de personagens para acompanhá-lo em suas aventuras, como os amigos Nestor, Pedrão e Afonsinho, a namorada Rosinha, o rival Zé Galo e os sobrinhos Zico e Zeca, além de uma associação de cobradores para as dívidas do malandro –uma virada e tanto para um personagem que nasceu no luxo do Copacabana Palace.