MÚSICA

Duda Beat conquistou a admiração de Caetano Veloso, Djavan e Gilberto Gil

Divulgação/Fernando Tomaz

Entrevista

Duda Beat planeja carreira internacional: ‘Cantar maracatu em inglês’

Admirada por veteranos e novos artistas da MPB, a cantora pernambucana celebra trajetória e quer mirar em hits internacionais "com a cara do Brasil"

Nicolle Cabral
Nicolle Cabral

A lista é grande: Caetano Veloso, Djavan, Gilberto Gil e Gal Costa são alguns (dos muitos) nomes da velha guarda da MPB que cultuam carinho por Eduarda Bittencourt. O primeiro deles, inclusive, incluiu o nome artístico da cantora, Duda Beat, em Sem Samba Não Dá, faixa do recente mais disco, Meu Coco.

“O Caetano vai citar a Duda em uma música dele”, relembra a artista sobre a mensagem enviada pela equipe do veterano. “Liguei para todo mundo: ‘Gente, vai sair a música do Caetano e ele citou o meu nome (risos)”. Em entrevista à Tangerina, Duda Beat celebra o reconhecimento com emoção. Os dois demonstraram o afeto mútuo no palco do Nômade Festival, no Memorial da América Latina, em São Paulo, no último sábado (14).

Além dos nomes já citados, a artista que conquistou o Brasil com o hit Bixinho também coleciona a admiração de novas bandas brasileiras que percorrem o mesmo caminho a partir da música alternativa, entre eles O Grilo e Jandaia. Mas não para por aí: Janja Lula Silva, atual mulher do candidato à presidência Luiz Inácio Lula da Silva, é fã de Duda. Essa identificação, inclusive, levou Janja a convidar a pernambucana para ser uma das vozes do jingle Lula Lá, relançado para a campanha de 2022 do político. “Ser uma voz para a minha geração, para mim, é muito importante”, discorre a artista.

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Ou seja, desde o primeiro estouro —que não precisou das engrenagens do TikTok—, a artista captou a atenção da classe musical intelectual e de mais de 1 milhão e 400 mil ouvintes mensais que a acompanham no Spotify. “Quero muito olhar para trás, quando eu estiver bem velhinha, e ver que eu não me arrependo de nada do que eu lancei. Que as minhas músicas envelheceram bem”, discorre a cantora sobre o impacto que sua figura desperta nas gerações passadas e atuais. “Acho que esse pode ser o maior legado que eu posso deixar para os novos artistas.”

Para Duda, o sucesso de Sinto Muito deve-se não só à qualidade musical, mas pelo fato de a cantora nunca ter abandonado as próprias raízes. “Isso está na minha vida, essa mistura que eu faço do pop com Pernambuco”, afirma, quando se refere aos ritmos do brega, pisadinha e forró, dos quais é fã e devota. Ao lançar o segundo disco de estúdio, Te Amo Lá Fora (2021), isso se concretizou ainda mais. Porém, elevou a artista a outro patamar.

‘Eu não tinha o objetivo de ser comercial’

Como foi fazer um segundo disco, sabendo que o primeiro já tinha dado certo? Rolou uma pressão?

Rolou uma super pressão, mas eu segui meu coração. Aconteceu algo muito louco comigo, porque eu tinha uns shows marcados no final de março [de 2020] e eu tinha um intervalo entre o último que eu havia feito até o próximo. Então, peguei esses dias para subir para a serra do RJ com os meninos [Tomás Troia e Lux Ferreira]. Na época, ninguém estava falando de pandemia ainda. No meio da nossa imersão, descobrimos que estava rolando tudo isso. Terminei o disco lá, letras e melodias. Fizemos o disco durante o ano inteiro, com calma, e voltamos. Foi um jeito diferente de ir pensando em cada etapa.

Eu tinha na minha cabeça algo muito forte. Eu queria que o meu segundo disco fosse atemporal. Acho que a gente bota muita intenção nas coisas. O primeiro disco era de apresentação, um disco mais leve, até em produção. O segundo eu tinha a intenção de fazer um disco foda. Atemporal. Aquele que daqui a 10 anos as pessoas vão olhar e pensar: “Pô, esse disco estava muito à frente do tempo”, e essa era a minha intenção.

Duda Beat conquistou a admiração de Caetano Veloso, Djavan e Gilberto Gil

Duda Beat conquistou a admiração de Caetano Veloso, Djavan e Gilberto Gil

Divulgação/Fernando Tomaz

Acho que joguei muito disso pro disco. Por isso, ele tem essas coisas, muitos arranjos, é meio pesado até. Desiludido, debochado, sombrio. Meio filme de terror. Eu sinto que eu tinha a intenção de fazer o disco dessa forma, e ele me colocou em um lugar de respeito. Eu não tinha o objetivo de ser comercial, eu tinha o objetivo de alcançar esse lugar [de admiração].

Eu me questionei muito sobre como eu ia lançar esse disco. Foi um momento de muita dúvida. Acho que até mais do que “lançar um segundo disco, de entregar uma coisa tão boa ou melhor que o primeiro”. Acho que rolou esse peso, mas teve a dúvida do “como é um lançamento sem show?”. Acabei lançando porque senti que precisava pôr no mundo, as pessoas precisavam ouvir em casa, saber o que aconteceu comigo nesse tempinho.

Era ‘mais dark’

Em Te Amo Lá Fora, Duda amplia não só a própria base instrumental, como cria um território criativo, favorecido pela evidente volta das guitarras na música pop e temáticas visuais mais sombrias. “Acabei inaugurando essa fase [da era do terror] no Brasil. Não tinha ninguém fazendo isso aqui”.

No Nômade, inclusive, você estava com um lookinho super “lavagirl”. Você foi impactada por essa onda do pop punk?

Sim, tudo referência. Fiz um show em Londres, e lá é o berço do punk, né. A minha estilista favorita é a Vivienne Westwood, eu sempre falo dela em todos os lugares, acho ela incrível. E um dia lá eu falei assim: “Gente, eu sei que vocês querem conhecer [Londres] e tal. Mas eu vou na loja da Vivienne”. E aí todo mundo ficou rindo. Fui na primeira loja que ela fundou, é toda torta. Cheguei lá e tinha umas roupas que ela refez dos Sex Pistols, acabei adquirindo umas coisinhas. Quando voltei, troquei com o Leandro [diretor criativo]: “Acho legal a gente começar a trazer essa coisa do punk para a minha estética, né?”. O punk é uma super referência para mim.

Assista ao clipe de Nem Um Pouquinho

A faixa é uma parceria com o artista Trevo

Carreira internacional

Embora o segundo disco tenha sido acompanhado de receios, devido à pandemia de Covid-19, durante o período isolado Duda Beat prosperou musicalmente, e é a partir deste registro que ela promete expandir sua música para fora dos solos brasileiros.

Você pretende se projetar musicalmente para fora do país?

Com certeza. Tenho muita vontade de cantar em inglês, que eu já falo, e espanhol. Uma língua que eu só falo quando eu estou borracha [bêbada, em português] (risos). Eu ficava nos bares de Madri e Barcelona, com a banda, dizendo: “Pessoal, bora tomar um chupito”. Chupito é tipo uma dose. Depois da terceira, a fluidez vinha [risos]. Mas eu preciso mesmo fazer aulas, quero colocar como uma das minhas metas esse ano. Quero me aprofundar na língua, fazer músicas em espanhol, inglês. Quero investir na carreira internacional.

Como foi a turnê internacional?

A turnê foi maravilhosa, teve lugares que deu sold out (esgotado) e as pessoas estavam desesperadas querendo ingressos. Então, significa que eu posso voltar em lugares maiores. Abrimos duas datas cheias em Dublin, Barcelona, Lisboa… Sinto que agora posso voltar nesses lugares com ainda mais estrutura. As pessoas lá me entendem um pouco mais, não que aqui não entendam. As pessoas aqui sabem do país que nós vivemos, super machista, enfim. Mas lá as pessoas compreendem muito o meu som, que é cheio de elementos. Então, foi muito gostoso ter ido lá, atravessado o Atlântico e ver que as pessoas entendem.

Embora o funk já tenha atravessado essa fronteira, você acha que é um desafio levar outros ritmos para fora?

Acho que eles são abertos para ouvirem coisas novas. É um público diferente. No Brasil, o público brasileiro é o que canta, é o que grita. Lá, eles prestam atenção. E eu acho maravilhoso, porque a pessoa está prestando atenção, pensando que nunca ouviu aquele ritmo. Então, para eles, rola uma curiosidade muito grande. Eu tenho muita vontade, um dia, de trazer esses ritmos do Nordeste, maracatu, em inglês, em espanhol. Acho que vai ser muito bem aceito. Eu sou uma pessoa muito positiva, né (risos). Mas acho que a galera vai curtir, vai abraçar. Meu pensamento é esse.

Terceiro disco a caminho

Em meio à turnê de divulgação de Te Amo Lá Fora, Duda também promete focar em um terceiro projeto. E já garante: “vai ser diferente dos dois primeiros”. Segundo a artista, ela acredita estar em um momento muito mais livre e “muito empoderada”. “Vai ser muito bonito”, enfatiza.

Caso surja alguma ansiedade ou incerteza no caminho, Duda já tem um mantra: “‘Calma, Eduarda. Tá tudo bem. O Caetano te acha foda, o Djavan, a Ivete. Tá tudo certo'”. No final, Duda Beat tem beleza, tem carisma, talento, e também tem o povo.

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Antes de ser repórter da Tangerina, Nicolle Cabral passou por Rolling Stone, Revista Noize e Monkeybuzz. Nas horas vagas, banca a masterchef para os amigos, testa maquiagens e cantarola hits do TikTok.

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