Reprodução/Pierrot
Lançado em 1999, mangá é citado como uma das grandes obras do gênero; anime exibido entre 2002 e 2007 ficou datado? Fizemos o teste
Um dos maiores animes de todos os tempos, Naruto (2002-2007) tem seu nome gravado na história da cultura pop como uma obra que marcou gerações. Ao lado de fenômenos como Dragon Ball e One Piece, a produção foi um dos pilares responsáveis pelo crescimento da popularidade dos animes e abriu caminho para que outros títulos alcançassem a graça tão almejada.
Criado pelo mangaká Masashi Kishimoto, Naruto foi publicado pela Weekly Shonen Jump entre 1999 e 2014, resultando em 72 volumes. A adaptação em anime, produzida em parceria pelo Studio Pierrot e Aniplax, ajudou a consolidar a obra como uma das mais relevantes a chegar ao Brasil.
Apesar de o currículo de Naruto ser invejável, o tempo nem sempre trabalha a favor de obras que outrora foram referência em seus nichos. No caso de animes, a passagem dos anos muitas vezes desfavorece certos títulos, seja pela tecnologia datada ou pelo texto ultrapassado. Se até mesmo séries e filmes recebem olhares tortos quando revisitados, produções japonesas, por conta das diferenças sociais e culturais, acabam sofrendo ainda mais.
Por estes e outros fatores, assistir a Naruto em pleno 2023 poderia ser uma missão fadada ao fracasso. Na época em que o anime foi exibido, o mundo e a forma de consumir e produzir conteúdo eram completamente diferentes. Um mangá famoso que fora adaptado para as telinhas muitas vezes demorava anos para chegar ao Brasil, e a velocidade com o qual os estúdios trabalhavam para adaptá-lo acabava ultrapassando a própria publicação do texto original. Com isso, a criação de fillers –episódios que pouco ou nada acrescentam à história principal– tornou-se, infelizmente, necessária.
Tais fillers esticaram tanto a obra que, dos 720 episódios entre o anime original e Naruto Shippuden (2007-2017), mais de 200 são não canônicos. Numa era em que as pessoas priorizam a rapidez e o consumo do maior número de coisas em pouco tempo, uma produção tão longa poderia assustar qualquer um que não seja um otaku. Para este que vos escreve, no entanto, o clássico de Masashi Kishimoto superou (quase) todas estas barreiras.
Aos 32 anos, escolhi assistir a Naruto pela primeira vez nos últimos meses de 2022. Fã de clássicos como Dragon Ball Z e Pokémon, sempre adiei a experiência de acompanhar a história do jovem ninja pelo enorme volume de episódios e o medo de a história parecer datada. Para a minha grata surpresa, o resultado final foi muito mais positivo do que o esperado.
Os personagens de Naruto
Divulgação/Studio Pierrot
A trama do anime/mangá conta a história de um mundo povoado por ninjas no qual o protagonista homônimo tem dentro de si a temida e poderosa Fera de Nove Caudas, responsável pela destruição da Vila Oculta da Folha no passado. Naruto Uzumaki, de 12 anos, cresce renegado por quase todos os habitantes da região e sonha em se tornar Hokage, o cargo dado ao líder político e militar da vila.
Naruto, assim como muitas obras de mangá, tem em seu personagem principal o clássico herói de valores inquebráveis. Apesar do baixo intelecto e do jeito impulsivo, o pequeno ninja luta pelo certo e é praticamente incorruptível. Como ele mesmo diz, seu estilo ninja consiste em sempre cumprir suas promessas e nunca abandonar seus amigos.
A grande rivalidade com Sasuke Uchiha, seu melhor amigo que acaba se tornando um dos principais vilões da franquia, é até hoje replicada em outras obras e em formatos diferentes. Títulos de sucesso recente como Chainsaw Man e Jujutsu Kaisen recorreram ao uso do trio de protagonistas (dois homens e uma mulher) e um mestre carismático, mas misterioso, e claramente beberam da fonte de Naruto.
Entre Naruto e Naruto Shippuden, dezenas de personagens que habitam o mundo ninja são apresentados, entre heróis e vilões. Além de Naruto, os principais destaques são Sasuke e Sakura, dois aprendizes que, ao lado do protagonista, treinam sob a tutela do misterioso Kakashi. Dentro do núcleo da Vila Oculta da Folha, nomes como Rock Lee, Gaara, Shikamaru e o velho sábio Jiraya roubam a cena em diversos momentos e até hoje aparecem em listas de fãs como os mais relevantes de toda a saga.
Diferentemente de obras como Dragon Ball que, apesar da popularidade, nunca se destacaram por serem profundas, Naruto tem como um de seus grandes trunfos o desenvolvimento ao longo do tempo. O mangá foi publicado no Japão durante mais de 10 anos, e as histórias ganhavam profundidade conforme seus fãs amadureciam. Saem de cena os vilões que apenas querem dominar o mundo e entram personagens bidimensionais, com camadas que nada devem a produções live-action e subtramas que envolvem política, guerra e outros assuntos mais “adultos”.
O bom desenvolvimento de seu protagonista, contudo, não serve para todos os destaques da franquia. Uma das grandes críticas dos fãs do anime é o descaso com o qual a obra lida com personagens femininas, tratando-as muitas vezes como muletas ou meros objetos de desejo masculino. Isso inclui até nomes como Sakura e Tsunade, que mesmo sendo duas das principais personagens de Naruto, tiveram desenvolvimentos pífios quando comparadas ao protagonista e a Sasuke.
O visual do protagonista em Naruto Shippuden
Divulgação/Studio Pierrot
Como dito acima, Naruto é uma obra que respeitou o crescimento de quem o acompanhou desde início. Se o anime original (e a primeira fase do mangá) contavam com histórias mais “pé no chão” e sem grandes consequências para os protagonistas, Naruto Shippuden foi o responsável por injetar amadurecimento da trama e, com isso, trabalhar temas que pouco seriam aproveitados por crianças ou pré-adolescentes.
Na fase Shippuden, Naruto retorna à Vila Oculta da Folha após dois anos e meio de treinamento e 16 anos nas costas. Embora tenha arriscado a sua vida em missões altamente perigosas quando criança, o protagonista encara os vilões mais ameaçadores de toda a obra –e sofrendo muitas perdas no processo. Ao contrário do que ocorre em Dragon Ball, grande parte das mortes de Naruto não são reversíveis, o que faz cada grande luta deixar o espectador na ponta do sofá.
Conforme a trama avança e segredos importantes são revelados, as aventuras de Naruto abraçam o lado político da história. Esquemas construídos nos bastidores e golpes para tomar o poder passam a fazer parte da narrativa, enquanto reviravoltas surpreendentes revelam o lado obscuro de líderes que muitos achavam ser os representantes da paz.
Por não ter o mesmo pique nem o tempo livre da infância, fiz a opção de ver Naruto e Naruto Shippuden excluindo quase totalmente os episódios fillers. Desta forma, a narrativa ficou menos engessada e direto ao ponto, apesar da irritante insistência em incluir longas explicações baseadas em flashback.
Em comparação com animes contemporâneos, achei Naruto um dos que menos sofreu com a tecnologia datada. Apesar de o estúdio Pierrot deixar a desejar na arte de algumas batalhas, são vários os momentos épicos em que a produção entrega um resultado de encher os olhos. Pode não ter a mesma qualidade de um título como Demon Slayer, mas nem se compara a adaptações sofríveis como a de Berserk ou as primeiras temporadas de JoJo’s Bizarre Adventure.
Entre qualidades e defeitos, Naruto se mantém relevante após 24 anos da estreia do mangá e continua a conquistar novas gerações através da publicação de sua continuação direta, Boruto: Naruto Next Generations, que mostra personagens clássicos já adultos e novos rostos que assumem o protagonismo da narrativa. Se em pleno 2023 vale a pena assistir ao clássico? Sim, vale e muito.
Todos os episódios de Naruto, Naruto Shippuden e Boruto: Naruto Next Generations estão disponíveis no catálogo da Crunchyroll. A série clássica está com todos os episódios dublados e legendados, enquanto a segunda fase está parcialmente dublada na plataforma e na Netflix.
André Zuliani
Repórter de séries e filmes. Viciado em cultura pop, acompanha o mundo do entretenimento desde 2013. Tem pós-graduação em Jornalismo Digital pela ESPM e foi redator do Omelete.
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