Festival teve sua edição mais caótica e desorganizada desde que se mudou para o Autódromo de Interlagos; ouvimos o público para saber o que pode melhorar
É claro que o Lollapalooza Brasil não é culpado pela rápida e forte tempestade que caiu no Autódromo de Interlagos na última sexta-feira. Nem da ameaça de raios do domingo. Ambos os eventos interromperam as programações do festival e frustraram o público nos respectivos dias. Segundo a organização, aliás, 302 mil pessoas passaram pelo evento nos três dias desta edição
O Lollapalooza também jamais esperava lidar com a morte trágica do baterista Taylor Hawkins, do Foo Fighters, provavelmente o headliner de festivais mais popular do mundo. Além de cancelar o principal show do último dia, o evento ainda teve que correr para tapar o buraco da programação e homenagear Hawkins —o que acabou por fazer de maneira acertada.
Menos ainda tem o festival ingerência sobre a pandemia global que acometeu o mundo nos últimos dois anos. A tragédia sanitária fez o Lollapalooza se readequar em termos estruturais, logísticos e até mudar a escalação de artistas diversas vezes.
Ainda assim, o festival teve grandes méritos, como a Tangerina fez questão de mostrar em sua cobertura nos últimos três dias. O público se divertiu, tirou o atraso de dois anos sem um festival deste porte e viu shows memoráveis como os de Miley Cyrus, Pabllo Vittar, Doja Cat, Gloria Groove, Black Pumas, Jão e Emicida.
Tendo levado em conta tudo isto, é preciso dizer que esta foi a edição mais caótica e desorganizada desde que o Lollapalooza Brasil aportou no Autódromo de Interlagos, em 2014, após dois anos também confusos no Jockey Club de São Paulo.
Por mais que seja impossível interferir nas condições meteorológicas, não dá para o festival sempre ser refém da natureza ou achar natural as consequências disso. Não é aceitável que uma estrutura metálica desabe e machuque um frequentador, como ocorreu na sexta-feira. Não dá para a comunicação ser tão confusa quanto no domingo, quando parte do público era obrigado a evacuar o Autódromo por mais que não chovesse ou ventasse naquele momento. Um aviso mais claro de que aquela era uma medida preventiva, já que não daria para esperar os possíveis raios começarem a cair naquela área descampada para então agir, teria amenizado a situação.
E não é exatamente uma novidade que este período do ano é marcado por calor e tempestades em São Paulo. Em 2019, a edição anterior, um problema parecido já tinha impactado a programação do festival. Comparativamente, em 2019, o Rock in Rio viu um temporal intenso cair sobre o público na primeira noite de evento, durante o show do headliner Drake. A apresentação seguiu normalmente, apesar do imprevisto. Choveu e ventou mais na ocasião do que na sexta-feira do Lollapalooza. O impacto, porém, foi muito menor. Nem lama existiu, já que o gramado do Parque Olímpico da Barra é sintético.
Em 2023, Roberto Medina, “pai” do Rock in Rio, fará o The Town, seu megafestival em São Paulo, no mesmo Autódromo de Interlagos. E já prometeu deixar como legado uma reestruturação da área útil para grandes eventos por lá. O Lollapalooza ainda tem uma chance de tentar agir antes do concorrente.
A Tangerina também ouviu o público para saber o que pode ser feito para o Lollapalooza 2023 funcionar melhor.
Problemas amenizados nas edições anteriores, as enormes filas e a dificuldade para acessar algumas partes do festival voltaram em 2022. “Os acessos e serviços estavam muito mais cheios do que vi nas edições anteriores”, aponta Victor Vinicius Goes, de 25 anos, que vai ao festival desde 2014.
“Este ano, não gostei da organização dos serviços, como caixas e alimentação. A sensação foi de que foi projetado algo reduzido para um público tão grande e com alta demanda de consumo”, seguiu Goes.
Visivelmente, o Lollapalooza Brasil foi um festival com muita sujeira. Um tanto pela lama acumulada das chuvas do fim de semana, mas também por uma questão da organização. A piora foi notada por Maria Vitória Mendes Felix Costa, de 24 anos. “O festival estava muito mais sujo do que qualquer edição que fui. Faltava muita lixeira, quase não se via e quando via estavam lotadas. Tinha muito menos funcionários e staff, de uma forma geral. E vários lugares tinham um cheiro muito forte de urina, como nunca vi antes”, apontou a frequentadora.
Cristhiane Oliveira, de 26 anos, foi ao Lollapalooza Brasil pela primeira vez agora, em 2022. Ela estranhou a falta de empenho na revista quando entrou. “A segurança é zero. Não inspecionaram bolsa, não olharam nada. Se é tão fácil entrar com latinha, imagina com outra coisa [mais perigosa]. A fiscalização é bem branda”, afirmou ela.
Além disso, diversos relatos de furtos foram registrados nas redes sociais ao longo do festival.
Relatos e debates nas redes sociais apontam um atendimento insatisfatório do Lollapalooza Brasil a pessoas com deficiência. A humorista e influenciadora Pequena Lô, que é PCD, postou uma thread no Twitter sobre isso.
Maria Vitória Mendes Felix Costa, que também é PCD, fez coro. “O festival deveria repensar toda a estrutura que colocam pra pessoas com mobilidade reduzida e afins. A gente tem tanta dificuldade pra transitar no evento e as áreas reservadas ficam distantes do palco. Em alguns só dá para assistir aos shows pelo telão”, critica.
Em comunicado, o Lollapalooza Brasil afirmou que “tem como compromisso realizar um evento inclusivo, em que todos são bem-vindos” e que “todos os serviços serão avaliados e aperfeiçoados para as próximas edições”.
Outro ponto negativo desta edição foi a iluminação, principalmente nas áreas dos palcos Onix e Adidas e no trajeto entre ela e o palco Budweiser. Ambos são trechos de intensa peregrinação do público entre os shows, e a escuridão tornava os trajetos perigosos, ainda mais com buracos no gramado. Como agravante, a lama acumulada também era um obstáculo a mais que poderia ser contornado se a área estivesse melhor iluminada.
A falta de iluminação também é uma das críticas de Maria Vitória Mendes Felix Costa. A frequentadora citou ainda melhorias na higiene, maior número de áreas de descanso e pontos para carregar o celular.
Luccas Oliveira
Luccas Oliveira é editor de música na Tangerina e assina a coluna Na Grade, um guia sobre os principais shows e festivais que acontecem pelo país. Ex-jornal O Globo, fuçador do rock ao sertanejo e pai de gatos, trocou o Rio por São Paulo para curtir o fervo da noite paulistana.
Ver mais conteúdos de Luccas OliveiraTangerina é um lugar aberto para troca de ideias. Por isso, pra gente é super importante que os comentários sejam respeitosos. Comentários caluniosos, difamatórios, preconceituosos, ofensivos, agressivos, com palavrões, que incitam a violência, discurso de ódio ou contenham links vão ser deletados.
Ainda não tem uma conta?